A sua voz entrou nos nossos ouvidos em 2010, aquando da edição do seu primeiro disco “Uma Noite de Amor”. Entrou discreta mas insistentemente, sem ninguém explicar que o futuro do fado passa por ela ou fazer a lista das inovações que ficaríamos a dever-lhe. Um pouco como antigamente, primeiro chegou a canção; depois, o prazer duma voz.
O seu novo álbum “Fado Veneno”, com produção de Carlos Manuel Proença, repleto de grandes poemas e de compositores exímios, como Tozé Brito, Jorge Fernando, Maria de Lourdes Carvalho, Nuno Miguel Guedes, Paulo de Carvalho e até José Carlos Malato. O disco reúne um reportório irrepreensível e a fadista desvendou-nos um pouco mais dele em entrevista.
1. Porquê o nome do álbum “Fado Veneno”?
LR: “Fado Veneno” surge da letra escrita por José Carlos Malato, gravada no fado Porto de José Joaquim Cavalheiro.
Esta letra tem uma particularidade muito rara e muito interessante. Quando cantamos o amor ou o desamor, há quase sempre uma tendência para culpabilizar o parceiro. Aqui existe uma mulher cheia de carácter, capaz de admitir que o seu amor não é compatível com o da outra pessoa e explica claramente que esta separação na dose certa é remédio; na dose errada poderá ser “Veneno”.
2. Como surgiu José Carlos Malato para o tema, que dá nome ao álbum, “Fado Veneno”?
LR: José Carlos Malato é um grande apreciador de fado, a sua ligação ao fado vem de criança. O interesse veio crescendo, a ponto de começar a escrever poemas para fados.
Existe entre nós uma grande amizade e cumplicidade e tendo ele escrito poemas para outros colegas, que muito apreciei, fiz o convite e ele ofereceu-me o extraordinário “Fado Veneno”.
3. Como é que o álbum, ainda antes da sua edição, e particularmente o tema ‘Quando Chegar a Hora’ chega “às mãos” do produtor radiofónico Michael Rossi, que o escolheu para o seu programa Late Junction (BBC3)?
LR: Michael Rossi, produtor na BBC 3, é um apaixonado por Fado. Numa das suas visitas a Portugal, conheceu o meu disco de estreia “Uma Noite De Amor” que passou a fazer parte da playlist do seu programa”Late Junction”. Antes de ter terminado as gravações do “Fado Veneno” veio a Portugal, gravou ao vivo no “Faia” alguns temas do primeiro disco num ambiente bem tradicional para transmitir aos seus ouvintes. Por esta altura mostrei-lhe o trabalho que estava a desenvolver para o álbum “Fado Veneno” e aí surgiu o convite para estrear o disco no seu programa.
4. Como foi feita a seleção dos temas para este novo trabalho, uma vez que são inéditos. Foram letras/melodias que lhe foram dadas e guardadas ou a partir do momento em que traçou o que pretendia para o álbum foi convidando as pessoas adequadas para cumprir o objetivo final?
LR: Depois de ter escolhido “Meu Peito Rasgado a Fogo” de Maria de Lurdes Carvalho, do seu último livro de poesia para fado, encontrei o fio condutor do álbum: o autoconhecimento. Se escrevesse sobre mim seriam aquelas as palavras que utilizaria.
O convívio e a cumplicidade que mantenho com os autores permitiu-me procurá-los no sentido não só de escreverem sobre mim, como é o caso de Gonçalo Salgueiro em ” Ao Som Das Tuas Mãos ” , um fado autobiográfico, como entregaram-me histórias que já pudessem até estar escritas mas que de alguma forma eles achassem possível ter traços da minha personalidade.
Tudo isto lhes foi proposto sem que soubessem qual o objectivo e desta forma consegui neste álbum mostrar a forma como me vejo e perceber a forma como os autores me vêem.
5. Quando afirma que, na escolha de repertório, “expus-me mais, tive menos pudor, menos medo, despi-me mais dos preconceitos, quis mostrar ao público a minha forma de vida” (in Lusa) significa que também todas as pessoas que, de alguma forma contribuíram para este álbum (letristas, compositores, produtor…) são pessoas que estão próximas de si e por isso têm maior capacidade para a descrever e retratar?
LR: No álbum anterior optei por me refugiar nas historias de Amor, neste disco procurei partilhar a minha forma de estar na vida. O convívio com os autores e compositores neste caso é fundamental!
6. De que forma a experiência nas casas de fado se tem repercutido na sua carreira/vocação enquanto fadista?
LR: É um privilégio puder experienciar diariamente o ambiente acolhedor e intimista das casas de fado.
A primeira casa de fados onde trabalhei como profissional foi a de Alexandra, o “Marquês Da Sê”. Guardo até hoje os seus ensinamentos com a maior gratidão.
A minha maturidade artística vai tomando forma com os colegas fadistas, músicos, poetas, compositores e público, com quem tenho oportunidade de aprender e solidificar os meus conhecimentos.
7. Na sua opinião, como se explica o sucesso do Fado hoje em dia. Como é que o Fado tem conseguido conquistar um público mais diversificado e mais amplo?
LR: Este é um período muito especial no fado, todos os dias aumenta a curiosidade de conhecimento sobre a magia deste género musical.
O Fado tem que ocupar o lugar que merece, principalmente em Portugal. Foi neste sentido que tantos fadistas, como por exemplo a nossa Amália Rodrigues, o dignificaram e projectaram tanto a nível nacional como internacional. Se hoje o fado atravessa um bom período, foi porque as gerações anteriores à minha trabalharam e acreditaram que era possível!
A nós cabe-nos dar continuidade com o máximo respeito, e é isso que temos e vamos continuar a fazer com grande responsabilidade.
8. Depois da apresentação do álbum no Festival Caixa Alfama, quais são as próximas datas já agendadas?
LR: Os próximos concertos acontecem dia 10 de outubro, na Câmara Muncipal de Paris e dia 16 no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém, em Lisboa.
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Entrevista realizada por Joana Constante